quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Dia (im)Perfeito!




Era um desses dias em que o vento leva as folhas das árvores com pressa, o céu estava meio cinza... Não chovia, mas o Sol também não apareceu. Não era noite, mas também não parecia dia. São dias assim que me deixam um tanto quanto mal-humorada, confesso!O tempo parece brincar comigo... É como se a hora parasse mesmo sem deixar de passar... Estranho?É... Eu sei.
Felizmente ou não, quem decide minhas obrigações não é o meu humor, portanto eu tinha que fazer tudo como em outro dia qualquer.
Fui até a Lotérica pagar umas contas, tinha apenas um senhor na minha frente que gentilmente cedeu sua vez a mim. Sua imagem ficou martelando em minha cabeça... Pensando bem não martelou e não martelou porque não me lembro dele, na verdade não lembro porque não vi, assim como meu agradecimento foi quase que um sussurro e tenho certeza de que ele não ouviu. Que culpa ele tinha da minha chatice?Fiquei pensando que atos como o dele proporcionam a outras pessoas dias mais leves, são pequenos gestos que fazem a vida mais bela. É claro que reações como a minha fazem pessoas como ele desistirem de ser gentis. Bem que poderia existir um controle remoto pra que eu pudesse voltar à fita e corrigir... Não é a primeira vez que desejo tal controle...
Saí da lotérica com a mesma pressa que entrei, passava em frente à igreja. Parei. Tinha algo que me chamava, logo eu... Por um segundo me perguntei se era o tão falado CHAMADO DIVINO, no segundo seguinte o ceticismo voltou a correr em minhas veias. Eu tinha que entrar e tirar a prova, assim o fiz.
Não era uma cena comum, fazia alguns anos que eu não entrava em uma igreja e confesso que era por falta de vontade... Por falta de fé talvez, confesso também que nunca achei que me fazia falta. Não é a toa que considero esses dias estranhos...
Lá estava eu, sentada em um dos bancos olhando para as imagens de Cristo a me perguntar como as pessoas conseguiam entrar lá, rezar e sair em paz tendo todo tempo olhado para a face do sofrimento... Incrivelmente eu também me sentia em paz,absolutamente em paz.... Vozes alteradas interromperam meu pensamento.
Um pouco distante de mim, nos bancos próximos ao altar estavam duas mulheres a discutir. Uma aparentava beirar os sessenta anos, usava óculos, cabelos grisalhos, seu traje transparecia simplicidade, não necessariamente falta de condições financeiras. A outra mulher parecia ter uns trinta anos, cabelos desgrenhados, usava uma saia e uma blusa que parecia ter encolhido.
Só conseguia decifrar o que a senhora mais velha dizia:
-Não!Já disse que não!
Ela parecia com medo e a outra que insistia aparentava cada vez mais irritação com a inflexibilidade da senhora.
Resolvi não me intrometer e nem poderia, talvez fosse assunto de família...
Poucos minutos depois a mulher da blusa encolhida veio em minha direção:
-Tem aí dois reais pra compra leite pros meus filhos?
-Não!-respondi automaticamente. Ela me encarou por algum tempo, pareceu engolir alguns palavrões e finalmente saiu da igreja.
É... Eu tinha dinheiro e não dei. Eu tinha (tenho) consciência e ela não me deixaria em paz pela minha, mesquinharia seria a melhor palavra?Ah, que seja!Em um instante pensei que não deveria financiar o vicio de ninguém, como eu poderia adivinhar o que ela faria?No outro instante já pensava que seja lá o que fosse parecia importante, afinal ninguém começa a mendigar por algo insignificante e para mim eram só dois reais!
Cadê aquela filosofia de mudar e tentar tornar o dia dos outros mais leve?
Não sei quanto tempo passei ali conversando comigo mesma, mas desencantei e resolvi ir atrás da mulher. Ela já estava longe, uns quatro quarteirões de distancia... Se eu tivesse dado os benditos dois reais eu estaria de consciência limpa e lustrada, mas pra que facilitar?
O que eu tinha a fazer era só ir atrás dela. Muito que bem!Eu fui, chamei por ela, mas parecia não me ouvir. O sinal abriu, tive de esperar os carros passarem e a perdi de vista!

Não voltei à igreja.
Não vi mais aquela mulher, nem o senhor da casa lotérica.
Não deixei de ficar mal-humorada em dias como aquele assim como não deixei de pensar como eu me sentiria se os meu sonhos e tudo que é relevante para mim fosse tratado com insignificância pelas outras pessoas...Será que eu continuaria a sonhar?Será que aquele senhor desistiu de ser gentil?E aquela mulher, como será que está agora?
Se esse tempo todo eu estivesse atenta ao que aconteceu ao meu redor... Talvez eu tivesse as respostas... Só posso desejar que venham as novas perguntas!
E você vê o que acontece com quem está ao seu redor?


Jéssica Elisa Posenato

4 comentários:

  1. Jéssica, mais uma vez se superando. Obrigado pela parceria, nós vemos nosso redor. Saramago diz: "Se olha, vê. Se vê, repara"

    O nosso problema, meu e seu, é que ainda não consigamos saber a hora de esperar pra falar, é que tamanha imbecilidade de algumas pessoas que eu tenho vontade de socar, sério mesmo. Mas, a gente aprende a lidar e a rir... fazer o que.

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  2. Jéssica, essa crônica virou minha favorita or algum, tempo.É, até eu ler outra e achá-la genial . Seus textos sõ muito bem elaborados, e não acho que vc passa horas trabalhando neles, a impressão que tenho é que eles fluem de dentro de você, não é. Mais, quero mais, é o tipo de leitura que me da prazer.bjus, Meire

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  3. Put's TU... É pra parar pra pensar com certeza... e vale a pena sim ser gentil...

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  4. Maravilhosooo!!!!!!!!
    Dá onde vem tanta criatividade???

    Aproveite esse dom que tem!

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