sábado, 14 de agosto de 2010

A contra politização da juventude


A contra politização da juventude

Os jovens e a política sempre foram aspectos indissociáveis da sociedade. Os recém saídos das fraldas como gosta de frisar minha mamãe, vão "formando" sua consciência política desde cedo e quando sentem-se seguros pra opinar e se fazer presentes para sociedade, começam a debater a política. E se vagar nesse mundo contraditório, hábil e perspicaz é difícil até para "macacos velhos", quiçá para adoslescentes em plena efervescência identitária.
Retomando a lógica das aspas colocadas no verbo formando, é necessário que eu explicite minha visão de como as conclusões políticas surgem.
Primeiramente, elas começam no local natural, no lar de cada pessoa. O ponto inicial é a educação recebida dos pais, que olhando de forma generalizada, apregoam valores muito semelhantes, com raras atitudes mais liberais tão quanto mais conservadoras. Especificando, as crianças brasileiras nascem em lares cristãos, geralmente católicos. A ética religiosa é sempre a mesma. Os dogmas de conduta social são os mesmos. Até o pãozinho de leite entregue nas missas antes da eucaristia é sempre igual. Porém, sempre era muito bom comê-lo.
É a vez da escola. As crianças são introduzidas num sistema educacional padrão, antigo e arcaico, que do meu ponto de vista atual, atua como modelador de identidades. É a fase intermediária da padronização que todos estão submetidos pela cultura brasileira. Lembro-me bem: eu era do tipo ordinário quando pequeno. Apesar de ter a pentelhação de um menino nada tímido, desde cedo submetia-me facilmente às imposições do sistema educacional. Aos 5 anos, se a professora pedisse que desenhássemos um carrinho azul, eu o desenhava. Mas sempre havia algum "burrinho", que no pensamento positivista que já havia se introjetado em mim, recusava-se a pintar o distinto carrinho de azul. A professora, ora calma ora ríspida, dizia para o "revolucionáriozinho" pintá-lo da cor pedida para que ele não fosse o mentecápito. O mini "Che Guevara" tinha que obedecer. Dentro da sala de aula, na boca de uma professora de primário, dentro daquele sistema educacional ordinário e padronizador, a palavra ordem consistia em algo irrefutável por dois motivos: por óbviamente não haver uma criança que pudesse aos 5 anos entender toda aquela conjuntura existente, mas também o motivo de que aquelas situações normativas poderiam vir a ser uma ponto fulcral na formação de mentes iguais. Logo adiante, chega a vez daquela que denomino primeira mudança radical do sistema educacional, que é a entrada à escola fundamental. Aliás, termo muito inapropriado essa "mudança radical", pois isso só acontece de fato na ansiedade íntima que a criança tinha. Afinal, o novo-velho sistema padronizador continua ali. E agora possui traços mais fortes e mais complexos. Agora existe horário de aula. Não há mais aquela brincadeira cotidiana no parquinho com os amiguinhos. A mensagem da coordenadora da nova-velha escola é clara: "Crianças, vocês já são mocinhos. Sejam bem-vindos!". Estufados de orgulho da tal mocidade, até aquele revolucionáriozinho do carrinho azul já não existe mais. O sistema é claro e a dúvida é passível de punição, até o nono ano. Novamente, é época de nova decepção/mudança. A entrada no ensino médio vem ser a fase derradeira da homogeinização das pessoas. É o retoque final da alienação que cabe à educação vigente no Brasil. Aqueles próximos três anos, configuram duas saídas: o (des)preparo para universidade ou para o mercado de trabalho. Não há tempo pra retóricas atrasadas e desvirtuantes do "processo natural das coisas", dizem os professores. O movimento estudantil é só algo simbólico. As matérias de estímulo ao senso crítico continuam à margem do curriculum escolar. Já estão todos convertidos em fiéis seguidores da (des)ordem e do (regresso?) progresso. Está findada em pinceladas breves a instituição escola na Terra Brasilis.
Paralelamente a tudo isso, a mídia possui grande responsabilidade na contra politização da juventude. Apesar de toda a aparente convocação à liberdade de expressão, de participação popular e financeira a que os jovens são estimulados, há intenções muitas vezes obscuras que precisam ser "reveladas". A mais simples das intenções, óbviamente é ser o alento ao jovem convertido ao sistema. Ela [a mídia] não precisa mais fazer o trabalho de base na cabeça das pessoas. O senso comum construído varagosamente por tantos anos de conteúdo homogêneo na escola, nos lares e no próprio ciclo vicioso que a cultura brasileira está inserida, já são o alicerce para manipulação. À mídia e ao estabilishment basta colher os frutos. Basta provar em discursos de analistas políticos de meia pataca que a sua inflexibilidade quanto à mobilidade social, à empatia com o próximo e a total devoção de que o mundo é assim, sempre foi assim e que o correto é se manter como tal é o próximo passo. É quando jabores da vida surgem como modelo de inteliggentzia a ser seguido. É quando o jovem tem a certeza de que a cultura brasileira, muito rica, mas de aspectos históricos horrendos e ainda muito presentes no inconsciente social das pessoas manifesta-se. Como disse Che: "ser jovem e não ser revolucionário é uma contradição genética". Nas devidas proporções, o hermanito socialista estava correto. Onde estão alocados os restos de um posicionamento mais liberal e mais visionário que o jovem deveria ter? Afinal, esse posicionamento é a máquina impulsionadora do progresso humano. Quando procuro nesta juventude atual esses traços que considero importantes, não o faço com obrigação de achar nesse meio um Emiliano Zapata, mas que pelo menos haja pessoas que se prestam ao benefício da dúvida. Mas nem isso os jovens hoje se dão ao direito. E isso é passível de prova. Faço o convite a qualquer leitor deste texto que saia a fazer uma mini pesquisa em seu local de estudo sobre questões tratadas como polêmicas, como os movimentos sociais, por exemplo. Perguntem aos jovens as suas opniões sobre a reforma agrária. Com certeza absoluta, afirmo que haverá uma resposta vencedora que acometerá mais de 70% dos entrevistados. E inclusive, chego a dizer que esses mais de 70% são totalmente contrários a uma democratização da terra. Tudo bem, a democracia privilegia a opinião da maioria. Mas refletindo sobre tudo aqui mencionado, será que existe uma linha muito tênue que separa a opinião da maioria da juventude brasileira com as verdades absolutas que toda essa conjuntura social prega? Pois há. E essa quase inseparabilidade dificulta a apropriação do macro conhecimento político que um jovem deve ter. Afinal, qual é o papel do jovem brasileiro hoje senão cooptar as mesmas convicções políticas que um homem-de-bem do séc XVII!?
Portanto, é extremamente benéfico aos jovens que procurem meios alternativos de informação e de construção identitária. As verdades absolutas só nos afastam do conhecimento de culturas mil, de percepção do mundo e principalmente do nosso auto-conhecimento. Afinal, é muito mais agradável aos olhos um salão com carrinhos azuis, vermelhos, verdes, amarelos, pretos, brancos...

Um comentário:

  1. Texto sensacional, parabéns...

    Mantenho um grupo no Facebook a alguns anos onde reúno alunos e professores exatamente com esta preocupação. Politizá-los. Peço licença para reproduzir seu texto lá, com os devidos créditos e já aproveito para convidá-lo a tomar parte nessa luta.

    http://www.facebook.com/groups/juventudepolitizada/

    Grande abraço

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