quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Adrenalina


Acabara de sair de mais uma aula para aquisição da permissão para dirigir automóveis. Logo ao lado da escola de direção, havia um buraco que dava saída aos gritos de uma torcida feminina. O buraco era a porta de uma quadra poliesportiva. Sendo assim, o Homem que é Homem do Veríssimo que há em mim, em todos nós, despertou. Fui até o local, vi pernas bonitas, gritinhos juvenis e uma disputa de voleibol. Voleibol masculino para ser preciso.
O jogo satisfazia as condições de disputa colegial. A torcida, as duas dúziasde garotas das respectivas escolas em disputa, eram uníssonas. As palmas de vinte e quatro mãos se comprimiam umas às outras e acompanhavam a nada criativa performance vocal: “(pá-pá-pá!) Idalina! Idalina! Idalina!”. Idalina era o nome de uma escola. A torcida outra, fazia o mesmo, apenas substituindo o nome daquela agremiação a ser gritada e neste caso gritava-se “Ephigênia! Epphigênia! (pá-pá-pá!)”.
Foi quando a adrenalina e os meus olhos entraram em sintonia. Mais cedo ainda que às 11 horas que o meu relógio de pulso marcava momentaneamente, eu vi a seleção brasileira feminina de vôlei perder um jogo para a seleção japonesa no campeonato internacional. O vôlei não havia pedido licença ao meu dia. Entrou de supetão com a derrota das belíssimas brasileiras. O que de interessante poderia haver então num ‘’jogazeco’’ de colegial em pleno alçar da minha fome pontual? Pois havia. Era a tal adrenalina que nomeia esta tentativa de crônica que escrevo. Ela, A safadinha (adrenalina), possui formas nada comuns, mas muito atraentes. Ela poderia ser também o que a minha vovó chamava de encosto, pois tomou de assalto o extinto mais sereno que havia ali naquela quadra. A cada ponto disputado, principalmente ganho, os times e os guris se alternavam entre sorrisos, urros, dancinhas à Michael Jackson – e pasmên - até beijos e abraços que garotos dessa idade não executam por receio de que algum cronista sem nada o que fazer poderia taxar como gesto de veado no bom brasileirês. Era lindo de se ver, visse! Eu tinha que participar também. E meu peito escolhera a torcida pela Ephigênia. Ah! Ephigênia! Era a escola que eu havia estudado nos idos do ano passado. E o time, era comando por uma ilustríssima ‘’raposa’’ do saber humano, uma professora querida, a qual me ensinara conceitos técnicos de esporte que não aprendi. Ela é mestra doutoranda do bem. É Honoris Causa da Universidade do Nosso Sinhozinho Deus. E como não podia ser, usava seu conhecimento psico-agregador para conduzir o time masculino de vôlei do Ephigênia à vitória. Mas como nem tudo são rosas, ali também estava a Idalina. E como a sabedoria é popular, se disputa esportiva é quente, imagina com nomes de mulheres? Eu é que não sou besta de queimar minha barra com nenhuma.
O jogo não estava disputado. A Idalina venceu fácil o primeiro set. Os moleques eram ágeis, mais altos e mais fortes, mais preparados. Eram um tanto soberbos, mas merecedores da façanha. A sua treinadora fazia a linha dura. Conhecia-a. Só pensava em vencer. Só. E vencia a partida. Mas, isso não vem ao caso quando se começa a relatar o início do segundo set. Pois o pior jogador do Ephigênia, o Léo, estava em quadra. Não sabia recepcionar uma bela loira que lhe dava mole, imagina uma bola sacada à força total? Esquece. Eu não dava nada por ele. Pra mim, era a assinar a derrota com papel timbrado em cartório do Polvo Paul da Copa Del Mundo. Porém, foi quando a adrenalina entrou em jogo sorrateiramente, literalmente inclusive, e Léo fez um pontaço maravilhoso à Giba. Nem a treinadora-psicóloga-humanista acreditava nisso. O time do Ephigênia muito menos. Ao ver aquela belezura de ponto, as expressões foram sentindo as inquietações da Safadinha. Em poucos segundos os jogadores, principalmente o Léo, estavam embriagados pela ela. Fora pontos e mais pontos. Urros, gestos, pulos e abraços eram distribuídos entre os companheiros de time. A treinadora ria e fazia transparecer em sua face amiga a felicidade. A torcida batia palma em ritmo variável, mas coordenado. Parecia torcida organizada do Corinthians. Era tudo lindo. E o empate se deseenhou no placar.
Ademais, ainda há uma constação psico-social a fazer sobre isso tudo. Nos times havia líderes, craques, melhores jogadores. Mas nenhum deles eram os mais exaltados. Dentre os embriagados pela Safadinha, o seu cambalear tinha pouca graça aos olhos do espectador em comparação a um jogador como o Léo, por exemplo. Léo parecia ter rompido o hímen da Angelina Jolie. Não precisava explicar o grau de felicidade. Era lindo de se ver. E bom de invejar. Era incrivelmente engraçado vê-los brilhar, uma vez sequer, numa cidade qualquer, observados por um cronista qualquer, num jogo qualquer, entregando-se à adrenalina de corpo e alma.
Naquele momento, eu senti uma vontade estranha de me afastar. De ir embora sem olhar pra trás. Era estranho, mas era uma sensação imperativa. Como se a bela morena me esperasse à mesa com um vinho do porto num longínquo lugar longe dali. Eu precisava ir embora. E fui. A adrenalina perdeu o efeito sobre mim. No lugar dela, havia algo análogo à sensação de uma noite bem dormida, quando você quer ficar um minuto que seja a mais na cama para que num passe de mágica pudesse guardar aquele conforto pra si. Era assim que me sentia. Segui a miragem da morena, fui-me embora. Não esperei o final do jogo.

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